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Foto do escritorSara Chiamolera

O método psicanalítico e o caráter subversivo da psicanálise

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O método psicanalítico não surgiu de uma teoria mas sim de uma prática de escuta que foi posteriormente teorizada, portanto, é indispensável compreender como ela se fundamenta. Essa técnica terapêutica desenvolvida por Sigmund Freud de iniciou-se com o abandono da sugestão hipnótica, onde o terapeuta não sugestiona, não dá comandos para o analisando. No entanto, cabe reconhecer a importância da hipnose, que naquela época serviu para mostrar a etiologia da histeria, confirmando que ela tinha origem psíquica e não orgânica, o problema, porém era que os sintomas não desapareciam por completo mediante a essa técnica, ou seja, a hipnose não dava conta de eliminar esses sintomas.


Dito isso, o que Freud buscava, era compreender a estrutura psíquica para que pudesse curar os histéricos, ou ao menos diminuir seu sofrimento. Freud reparou que a mente do indivíduo enganava o próprio indivíduo mesmo em estado hipnótico. Em vista disso, Freud decidiu não mais sugestionar sobre a origem dos sintomas de seus analisandos, dando então a palavra àquele que sofre. A sugestão hipnótica impedia e atrapalhava a percepção das resistências que, não por acaso, são aquilo que permite o entendimento e compreensão dos comportamentos e sintomas do analisando. Até esse momento Freud já sabia que os indivíduos sofrem e adoecem devido a traumas e a impossibilidade de reagir como gostariam à situações e aos afetos, reprimindo e recalcando essas reações, sentimentos e desejos. Dessa maneira, começavam a apresentar sintomas, que na época eram conhecidos como histeria, hoje em dia denominados como depressão, ansiedade, fobia, etc.


Nessa perspectiva, o sujeito resiste e sofre porque resiste, caracterizando então a psicanálise como uma análise das resistências do sujeito. E essa resistência está em falar de si mesmo, de seus afetos, dores, temores, traumas. Por isso, o indivíduo não pode estar hipnotizado, precisa ter consciência de como se defende de si mesmo, de como resiste ao que ele mesmo sente. Em vista disso, Freud transformou esse obstáculo — a resistência — em um questionamento: Por que o indivíduo resiste? Por que sofre? Por que evita?


Consequentemente, o psicanalista, em sua prática, já conta com o aparecimento dessas resistências e deve as colocar em questão. Nesse sentido, Freud recusa a sugestão e o comando, pois entende que o indivíduo resiste a reagir porque sofre de comandos internos e então a análise não deve ser mais uma fonte de comando e autoridade, mas sim de liberdade discursiva. Dessa forma, configura-se o método da livre associação de ideias, que constitui a regra fundamental da prática psicanalítica, ou seja, não sugestionar mas sim incentivar que o analisando fale o que lhe vier à mente procurando não censurar ou escolher o que diz ao analista.


Além disso, essa recusa à sugestão não é por puro capricho mas sim uma necessidade em busca da verdade do sujeito, aquela verdade em que o próprio indivíduo tem recusa a falar até para si mesmo, que é individual e intransferível, ou melhor dizendo, subjetivo. O que muitas vezes é percebido durante o processo analítico é que o sujeito não fala sobre o assunto para poder manter o seu comportamento, já que quando verbaliza têm-se alta capacidade de mudar sua relação e alterar sua realidade psíquica com relação ao trauma, ao afeto, ao sentimento, simplificando: o(s) sintoma(s) Logo, pode-se dizer que o sujeito não resiste em falar, mas sim em mudar. A resistência aparece como um conjunto de reações em que a psique do analisando produz para dificultar e criar obstáculos diante da sua análise, operando através dos mecanismos de defesa do ego.


Ademais, os afetos recalcados não são somente impedidos de aparecer na consciência mas são remanejados para o inconsciente, ficando envoltos em afetos defensivos, como se o conteúdo recalcado fosse o núcleo de um um envoltório cheio de camadas de resistência. Seguindo essa lógica, o objetivo da análise é chegar ao núcleo patogênico, que gera os sintomas, que é diretamente inacessível, contendo os afetos e reações que foram impedidas de serem exteriorizadas.


Portanto, a técnica psicanalítica, a partir da escuta da livre associação de ideias, do livre discurso, procura desvendar e desmontar essas resistências, já que a neurose se configura como uma reação exagerada diante de um fenômeno, buscando entender a estrutura da neurose para compreender como o indivíduo lida com esses afetos. Desse modo, o analista deve sempre incentivar o indivíduo a falar o mais livremente possível com o menor medo de condenação e julgamento, com o objetivo de permitir que o sujeito se defenda cada vez menos de seus afetos para diminuir além do sofrimento, as resistências ao tratamento.


Isto posto, retornando à questão da verdade do sujeito, que é única, singular, intransferível e portanto, subjetiva, o sujeito precisa aprender a lidar com o medo de ser punido pelo que sente, pelo que deseja. A verdade do sujeito é a verdade do desejo. Para a psicanálise, deve-se sempre optar pela verdade do sujeito em detrimento da verdade da autoridade. Essa autoridade pode ser entendida como as normas sociais, os julgamentos alheios no campo da família, das relações e da política.


Ou seja, pela própria função terapêutica, entre o que é “correto” para a sociedade ou para outras pessoas, até mesmo para o analista, deve ser posto de lado, independente do que as autoridades desejam sobre o desejo individual daquele sujeito. Esse ato de privilegiar aquilo que é subjetivo e singular do sujeito em detrimento a autoridade, faz da psicanálise uma teoria e prática um tanto quanto subversiva, pondo de lado as normas sociais e até mesmo as normas que o próprio sujeito tinha em relação a si mesmo e por consequência, reduzindo sua má disposição existencial e seu sofrimento, ou seja, seus sintomas.


Sara Cristina Chiamolera Psicanalista; Atendimentos on-line

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